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Três em cada quatro municípios divulgam situação epidemiológica da pandemia, mas as maiores calam-se

ACTUALIZAÇÃO DO ARTIGO “225 AUTARQUIAS DIVULGAM SITUAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA DA PANDEMIA, MAS AS MAIORES CALAM-SE”, PUBLICADO EM 24/02/2021

Foram incluídos dados do distrito de Viana do Castelo (via Altominho.tv)

O FAROL XXI andou a vasculhar os sites e redes sociais dos 308 municípios portugueses para saber quais aqueles que divulgam dados da situação epidemiológica da pandemia, incluindo os óbitos já registadas. Embora quase três em cada quatro divulguem essa informação, as maiores autarquias, como Lisboa e Porto, optam por nada dizer. Existem também diferenças regionais de cultura de transparência. Amanhã o FAROL XXI divulgará uma inédita análise do verdadeiro impacte da covid-19 por concelho, com base nos óbitos e casos positivos registados desde Março de 2020 até Fevereiro de 2021.

Pedro Almeida Vieira

Quase um ano após o início da pandemia, o Ministério da Saúde continua sem divulgar os casos fatais por covid-19 ao nível municipal, mas uma recolha detalhada de informação nas autarquias e outras instituições oficiais, feita para o FAROL XXI, permitem conhecer os impactes concretos da pandemia em 233 dos 308 municípios portugueses. Este levantamento possibilita assim, pela primeira vez desde Março do ano passado, que se tenha finalmente uma percepção real sobre os efeitos concretos desta nova doença ao longo do país, bem como identificar ou confirmar quais os municípios onde esta se mostrou mais letal em lares. O FAROL XXI divulgou, também, integralmente, a análise detalhada por concelho, incluindo os valores da taxa de letalidade, da taxa de mortalidade e do peso da covid-19 na totalidade dos óbitos desde o início da pandemia para todos os 225 concelhos com informação da situação epidemiológica, aqui

Nesta inventariação, tendo como data de referência o dia 20 de Fevereiro, consultaram-se sobretudos os sites e as redes sociais da totalidade dos 308 municípios, bem como das autoridades de saúde locais de Portugal Continental, Açores e Madeira. 

Apesar de este levantamento permitir concluir que uma elevada quantidade das autarquias divulga regularmente informação completa da situação epidemiológica (casos positivos acumulados, casos activos e óbitos), salienta-se, porém, que a maior parte dos gestores políticos dos municípios de grande dimensão nada dizem. Com efeito, os autarcas de cidades como Lisboa e Porto, e quase a totalidade dos de concelhos destas duas áreas metropolitanas, consideram não ser importante informar os seus munícipes sobre o impacte efectivo da doença. Por exemplo, nos cinco maiores municípios do país (Lisboa, Sintra, Vila Nova de Gaia, Porto e Cascais) nenhuma informação epidemiológica é transmitida nos sites ou redes sociais – que constitui, por regra, os meios de divulgação usados pelas autarquias que a facultam –, nem sequer o número de casos positivos. Para estes autarcas, os seus munícipes não precisam deste tipo de informação. E muito menos saber quantos casos activos e óbitos se registaram já. 

As excepções à falta de cultura de informação e transparência nas autarquias de maior dimensão são poucas. De entre os 24 concelhos portugueses com mais de 100 mil habitantes, apenas em cinco (Funchal, Leiria, Oeiras, Setúbal e Vila Franca de Xira) se consegue saber, através das autarquias, quantos são os óbitos causados pela covid-19. No caso dos concelhos que são sede de distrito em Portugal Continental, as autarquias de Aveiro, Beja, Évora, Faro, Guarda, Leiria, Portalegre, Santarém, Setúbal, Viana do Castelo e Viseu divulgam informação epidemiológica completa. As outras oito não, a saber: Braga, Bragança, Vila Real, Porto, Coimbra, Castelo Branco e Lisboa. Nas regiões autónomas dos Açores e da Madeira pode conhecer-se a situação epidemiológica de todos os municípios.

A atitude de obscurantismo informativo de muitas destas autarquias segue a linha do primado da Direcção-Geral da Saúde (DGS). Na gestão da pandemia, a autoridade de saúde nacional apenas divulga o número de casos positivos a nível concelhio – e que serve, aliás, como indicador único para estabelecer restrições e avaliar risco – e nunca distingue, nesta escala geográfica, as incidências por grupo etário nem por local (lares). E nunca, em momento algum, divulgou a mortalidade nem os casos activos por município. Apenas vai transmitindo o número de casos e mortes por grande região (Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo, Algarve, Açores, Madeira), mesmo sabendo muito bem a existência de grandes diferenças entre municípios. 

O problema de transparência parece ter também outra dimensão além da populacional (e de “grandeza” política), uma vez que salienta um claro padrão regional (ou cultural). De facto, sendo notório que quanto mais populoso um concelho maior probabilidade de não ser dada qualquer informação aos munícipes, impera também um factor regional. Os municípios do Centro e Sul do país mostram, de forma evidente, uma maior cultura de informação, enquanto na região Norte e concelhos em redor de Lisboa os autarcas têm um comportamento inverso, parecendo ver os cidadãos mais como súbditos – que estão ao dispor dos senhores feudais, que não lhes têm de prestar contas – do que como munícipes.

© João Cláudio Martins

Assim, a esmagadora maioria dos concelhos dos distritos de Braga, Porto, Bragança e das zonas mais urbanas dos distritos de Lisboa e Setúbal não manifestam qualquer interesse em informar os seus munícipes sobre a situação epidemiológica da covid-19. Ao invés, em muitos outros distritos, a norma é ver os municípios informarem regularmente, com frequência por vezes diária, e isto mesmo em concelhos de pequena dimensão, onde as variações diárias de casos positivos e óbitos são pequenas. 

Merece, neste cenário, um destaque especial, por positivo, a atitude da Unidade Local de Saúde (ULS) do Norte Alentejano. Mesmo se inserida numa Administração Pública pouco atreita à transparência, esta entidade responsável pela prestação de cuidados de saúde no distrito de Portalegre tem vindo a realizar, e divulgar no seu site, um relatório diário da situação epidemiológica nos 16 municípios da sua área de influência, incluindo sempre os casos ainda activos e os óbitos. Na Madeira, a Secretaria Regional de Saúde e Protecção Civil também divulga um relatório similar. Noutros dois casos – Direcção Regional de Saúde dos Açores e ULS do Alto Tâmega e Barroso –, os boletins não têm divulgação pública activa, mas algumas autarquias colocam-nos nos sites ou redes sociais, permitindo assim que se conheça a situação de outros municípios.

Embora a comunicação social de âmbito nacional (televisões, jornais e rádios) jamais tenha mostrado qualquer interesse em pressionar o Governo para a divulgação da situação epidemiológica a nível municipal, na verdade alguns (poucos) órgãos da imprensa regional têm feito um acompanhamento regular na sua área de influência. Neste caso identificaram-se os jornais Médio Tejo e Mais Ribatejo (região de Santarém), o Jornal da Bairrada (parte dos distritos de Aveiro e Coimbra), a Região de Leiria e a Rádio Covilhã. Em grande parte dos casos, essa divulgação provém directamente dos denominados Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES), o que demonstra que, se houvesse pressão dos órgãos de comunicação social nacional junto do Governo ou da DGS, a situação epidemiológica por concelho, e também nos lares, seria conhecida por todos. 

Contudo, infelizmente, apesar de tantas horas de informação sobre a covid-19, nenhum director de informação da imprensa dita de referência, achou que conhecer os casos activos e a mortalidade por concelho fosse matéria relevante. Nem saber como se pode detectar problemas graves nos lares através do conhecimento da taxa de letalidade e cada concelho. Assim sendo, amanhã o FAROL XXI divulgará aquilo que é possível apurar, desde já, através da consulta da informação disponibilizada pelas Câmaras Municipais. Acrescente-se que o trabalho de recolha demorou uma meia dúzia de horas.

Fontes: Sites e redes sociais das 308 autarquias de Portugal; Secretaria Regional de Saúde e Protecção Civil da Madeira; Direcção Regional de Saúde dos Açores; Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano; Médio Tejo; Mais Ribatejo; Região de Leiria; Rádio Covilhã; Jornal da Bairrada e Altominho.tv.

Nota (01:25 de 26/02/2021): O município de Cascais também faz divulgação periódica da situação epidemiológica do concelho, algo que não consta nos mapas. No dia 22 estavam reportados 15.753 casos positivos (valor acumulado) e 345 óbitos correspondente a uma taxa de letalidade de 2,2%. 

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