Pedro Almeida Vieira | Economista e Engenheiro Biofisico
Sou um apreciador de factos, mas nem sempre um facto demonstra, inequivocamente, a casualidade entre dois eventos. Ou constitui prova de relação directa entre dois entes.
Por exemplo, pesquisando no Google por “Pedro Almeida Vieira” e por “burro”, em simultâneo, surgem 796 resultados. Ora, dessa ocorrência, esse facto, não resulta uma relação directa entre mim e os burros nem constitui prova de ausência de inteligência em mim.
Na mesma medida, se eu pesquisar no Google com os termos “Fernando Esteves” e “Máfia do Sangue”, o facto de me surgirem 273 resultados, não significa que haja uma relação directa entre o director do Polígrafo e o escândalo de corrupção na venda de plasma ao Estado.
Na verdade, o único facto relevante sobre esta matéria (Máfia do Sangue), que é assunto sensível e jurídico, que meta Fernando Esteves é a certidão do Tribunal Central de Instrução Criminal, datada de 4 de Maio deste ano, em que certifica que “José Fernando Macedo Esteves (…) não foi constituído arguido, nem acusado pelo Ministério Público da prática de qualquer crime no âmbito dos presentes autos; não foi considerado suspeito da prática de qualquer dos crimes investigados pelo Ministério Público nos presentes autos e não foi inquirido como testemunha, nem teve qualquer intervenção no âmbito dos presentes autos”.
Ponto final. Estes são os factos.
Fernandes Esteves é um homem inocente.
Mas sendo ele um inocente homem, o que não lhe fica bem é ser um jornalista, e sobretudo um putativo verificador-mor de factos, quando tanta coisa estranha lhe passa pela frente sem ele, supostamente, nada saber nem desconfiar..
Porque, na verdade, em redor dele passa-se de tudo.
Por exemplo:
a) O seu antigo sócio na empresa Alter Ego Lda., e amigo de longa data, Pedro Coelho dos Santos, fez assessoria de imprensa para Paulo Lalanda e Castro. E Fernando Esteves não sabia que o sócio e amigo facturava para a empresa comum. Segundo a revista Sábado, Fernando Esteves chegou a viajar até Londres para entrevistar Lalanda e Castro, e esse encontro (legítimo) terá sido, como refere a Sábado (vd. aqui, notícia de 11/11/2019), e referindo o Ministério Público, “arquitetado por Pedro Coelho dos Santos, Luís Cunha Ribeiro e o advogado Paulo Farinha Alves”. Aparentemente, Fernando Esteves também ignorava estas “démarches” do seu amigo e sócio (que é actualmente vereador sem pelouro da autarquia de Sobral de Monte Agraço e era, desde 2010, director do Gabinete de Marketing e Comunicação do INEM, com uma breve passagem por um gabinete ministerial e pelo INSA). Uma inocência de homem, o director do Polígrafo.
b) A editora e coordenadora do livro “Hepatite C: o futuro começou aqui”, Paula Ferreirinha – que Fernando Esteves só pode conhecer, porque recebeu 24.185,69 euros por ajuste directo para elaborar e editar esse mesmo livro – também meteu o dedo no caso Máfia do Sangue. E Fernando Esteves também não saberá certamente nada. Aliás, meter o dedo é, neste caso, literal. Em, Março de 2018, a comunicação social denunciou que, então como jornalista da TVI, Paula Ferreirinha “alertou [no início de 2016] Cunha Ribeiro [suspeito de corrupção passiva no processo Máfia do Sangue] e Manuel Pizarro [antigo secretário de Estado da Saúde à data] para o facto de a PJ ter pedido documentos ao Ministério da Saúde” (vd. aqui). Aliás, Paula Ferreirinha, antes de seguir para o Gabinete de Relações Públicas do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, foi muito mais assessora governamental do que jornalista: na última década e meia passou mais tempo por gabinete de imprensa governamentais (p. ex., assessorou a ministra da Saúde Ana Jorge, PS, e o ministro da Saúde Paulo Macedo,PSD). Fernando Esteves não deve saber disto tudo. Nem deve ter o director do Polígrafo achado estranho que o CHULN lhe tenha encomendado a elaboração de um livro sobre hepatite C por ajuste directo quando o próprio CHULN tinha no seu Gabinete de Comunicação esta antiga jornalista e ex-assessora de imprensa de dois ministros da Saúde. Se calhar não soube nem sequer conhece, porque de facto não existe nenhuma prova da sua relação de trabalho: o livro pelo qual Fernando Esteve recebeu 24.185,69 euros não tem nenhuma menção a si; apenas à antiga jornalista e assessora governamental na área da Saúde.
Entretanto, chegou-me também a revelação que um certo Agostinho Macedo Esteves foi contratado em 2014 para a assessoria de comunicação da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARS-LVT), então presidida por Cunha Ribeiro, o principal suspeito de corrupção no caso Máfia do Sangue. Agostinho Macedo Esteves (que se cruzou na Universidade Independente com Paulo Coelho dos Santos) até recebeu um louvor de Cunha Ribeiro em Janeiro de 2016 (vd. aqui: https://dre.pt/application/conteudo/73664544). Dizem-me ainda que Agostinho Macedo Esteves é irmão de Fernando Macedo Esteves, director do Polígrafo, mas como sigo apenas factos, e há imensas coincidências, não tenho essa confirmação. Não tenho essa prova. Apenas sei que são amigos no Facebook e no Linkedin. Mas isso nada diz. Aliás, nada neste meu post contradiz a douta certidão que aqui aponho sobre a inocência de Fernando Esteves. Apenas revela que, além de um homem inocente, Fernando Esteves é um inocente homem: tudo lhe passa pela frente, mas ele, ingenuamente, nada sabe. E de facto, não há aqui nenhum facto que demonstre que todas estas ligações estão relacionadas com o facto de Fernando Esteves ter recebido uma prenda no sapatinho em 2018: um cheque público de 24.185,69 euros pela feitura de um livro onde nada consta que tenha lá metido o dedo. Ou o pé. Todos inocentes. E nós todos somos ingénuos.