Pedro Almeida Vieira | Cidadão
(A pretexto dos 20 casos adversos de jovens vacinados em Mafra com menos de 30 anos)
Infelizmente, o conceito de risco e incerteza nunca é bem compreendido, ou nem sequer se quer compreender, mas volto sempre à carga. Mesmo assumindo que as vacinas – que se encontram na fase III dos ensaios epidemiológicos, i.e.., ainda têm um grau de incerteza – possuem uma eficácia de 95% na redução de mortes (ou casos graves), esse indicador tem de ser adaptado à idade, o mesmo se aplicando à incerteza. Nessa medida, quando estamos a falar de idades em que a taxa de letalidade (que se associa ao risco) é muito elevada, a redução do risco de morte pode compensar a incerteza, ainda mais quando essa incerteza se refere a médio e longo prazo.
Ora, mas quando estamos a falar da vacinação de jovens (ainda mais quando se mostra evidente que as vacinas não impedem a capacidade de se ser infectado e infectar), o caso muda de figura. Bastante. Segundo os dados da DGS, desde Março de 2020 morreram 2 bebés com menos de 1 ano (ambos com malformações congénitas graves) em que a causa foi atribuída (enfim!) à covid. A mortalidade por todas as causas em bebés com menos de um ano foi de 252 em 2019, em cerca de 87 mil nascimentos. Note-se que Portugal tem das mais baixas taxas de mortalidade infantil do Mundo.
Se pegarmos na população com menos de 20 anos (cerca de 1,93 milhões de pessoas), a C19 terá sido a causa da morte de 4 pessoas (todas com malformações). Isto significa uma morte por cerca de 500 mil pessoas neste grupo etário. Em 2019, ano anterior ao início da pandemia, morreram 518 pessoas com menos de 20 anos em Portugal por todas as causas. Já agora, por pneumonias e infecções respiratórias afins morreram em 2018 (último ano disponível) 16 pessoas deste grupo etário.
No grupo dos 20-29 anos (1,1 milhões de portugueses), morreram por C19 (causa indicada) 12 pessoas desde Março de 2020. Ou seja, uma pessoa por cada 92.063 deste grupo etário. Se quisermos por percentagem temos então 0,0011% (arredondado por excesso). Por todas as causas, em 2019 morreram 416 pessoas deste grupo etário. Por pneumonias e afins, neste grupo etário morreram 5 pessoas em 2018, chegando às 8 em 2016, o que significa que a C19 não parece ser, para estas idades, uma doença letal demasiado preocupante (face às outras infecções respiratórias anteriormente existentes).
Mais contas poderiam ser feitas, mas estas parecem-me suficientes para (mais) uma reflexão.Como as vacinas apenas diminuem o risco de gravidade da doença – e, repete-se, não a possibilidade de infectar e ser infectado –, um programa de vacinação em massa em jovens resulta apenas na redução de um risco já extremamente baixo em comparação à não vacinação. E apenas introduz, para estas idades, uma incerteza, que, como está inerente ao próprio conceito, se ignora ainda a dimensão, podendo ir desde nada até consequências a médio e longo prazo bastante graves. Lembrem-se sempre que estamos ainda na fase III dos ensaios epidemiológicos e NUNCA se fez anteriormente vacinação massiva para outra qualquer doença nestas condições.
A prudência, um dos princípios básicos em Saúde Pública, deveria recomendar muita cautela na vacinação contra a C19 de adolescentes e jovens adultos. Seria muito mais eficiente (similares resultados com menos recursos) identificar os indivíduos de risco nestas idades, e vaciná-los – serão poucos milhares, certamente –, e continuar a controlar, mas sem pânicos, aqueles que fossem apresentando sintomas para evitar surtos incontroláveis.
Aquilo que os Governos andam a fazer – e particularmente o de Portugal – com as pressões e “incentivos” para a vacinação dos mais jovens (por exemplo, com a transformação do certificado digital em livre trânsito para restaurantes e locais de diversão) é de uma irresponsabilidade enorme, não apenas porque vacinar jovens com este tipo de estratégia resultará numa poupança de vidas irrelevante (lembrem-se, não me canso de repetir, que os vacinados podem infectar e ser infectados, i.e., um jovem vacinado pode infectar um idoso mesmo que vacinado) como coloca em risco (por causa da incerteza ainda hoje existente) a saúde no futuro de alguns milhões de portugueses. Sem necessidade.
Última nota: Além de tudo isto, desviar as vacinas que se querem dar aos jovens portugueses (sem préstimo para a Saúde Pública nacional) para os países mais pobres (para vacinar idosos e vulneráveis) resultaria num evidente e bem quantificável número elevado de vidas salvas. Mas isso pouco interessa, não é? Afinal, os egoístas são apenas todos aqueles que, independentemente da justeza e legitimidade dos seus argumentos, contestam a estratégia do Governo nesta matéria, não é assim?