
Eduardo Rêgo | Professor (aposentado) do Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto


A Inglaterra levantou hoje as restrições, o que naturalmente suscita expectativas, entre esperanças e receios – e secretas rezas agoirentas dos que há um ano víamos a rejubilar com as subidas da mortalidade sueca. “A Europa olha com preocupação para a experiência britânica…” E multiplicam-se as opiniões dos especialistas convidados…
Porque será que nessas opiniões nunca vejo serem discutidas nem sequer referidas as razões básicas que os ingleses dão para terem decidido correr o risco de poderem ter até 100.000 casos diários?
Elas são: menor relação entre os números de contaminados e de internamentos e menor gravidade destes. Que actualmente para o mesmo número de casos positivos os internamentos são dez vezes menores em comparação com o Inverno. E além disso os internamentos são menos graves: enquanto em Janeiro teria havido uma morte em cada 60 internamentos, a razão será agora de 1 para 1000.
Não estou a dizer que as razões justificam a decisão. Nem o contrário. Não sei. Apenas a perguntar porque os especialistas convidados não as discutem nem referem!
E não é que os especialistas convidados as desconheçam, pelo menos na sua essência, ainda que sem números: que a relação entre a quantidade de contaminados e a gravidade, e urgência, da doença evoluiu para uma proporção muito mais favorável. Caso contrário a grande preocupação seria, de novo como há um ano, o “genocídio” esperado (para usar a palavra tantas vezes então referida para a Inglaterra e a Suécia).
Surpreendentemente a preocupação que vejo ser referida é a de que o crescendo do número de casos favorecerá o aparecimento de variantes. E essa preocupação tem duas vertentes. Uma é a da possível maior malignidade, como doença para os contaminados e não como maior transmissibilidade. A outra é a possível perda de eficácia das vacinas.
Em relação à primeira surgem perguntas naturais. As variantes “já cá andam há muito”. Porque é que os especialistas nunca referem “estudos” que tenham indicado de forma convincente que a XY-variante se revelou mais maligna? Porque será que se há variantes mais malignas aquela relação entre números de contaminados e gravidade da doença decresceu tanto? Porque será que os ingleses, estando já desde Maio preocupados com a famosa e preocupante Delta (foi uma das razões invocadas para retirarem Portugal da côr verde) ainda assim avançaram para a sua decisão de levantar as restrições, como se considerassem que essa variante não põe em causa aquelas razões que aduziram?
Em relação à segunda, só uma e simples pergunta. As variantes, “já cá andando há muito” , são anteriores à conclusão da preparação das vacinas… Quando estas chegaram, levantaram-se dúvidas sobre a sua utilidade, a sua eficácia, precisamente por causa das variantes! A mesma preocupação que vejo agora estes especialistas levantarem. Apesar de outros especialistas, ou os mesmos! , nos virem dizendo, de forma geral, que as vacinas se têm revelado eficazes para as novas variantes… De qualquer modo, a pergunta: onde andam agora os especialistas que então nos asseguravam que o processo de fabricação das vacinas permitiria facilmente (lembro de ouvir falar em 2 ou 3 meses) adaptá-las a uma nova variante recalcitrante?
Por falar em vacinas e lembrando uma especialista convidada (médica) que ontem na SICN falava e defendia a vacinação dos mais jovens, para já a extensão aos 12-16 e mais tarde aos 6-12. Pelo que sei, na fase de ensaios das quatro vacinas que por cá se usam – pré-permissão por emergência já que não foram completadas todas as fases – apenas entraram voluntários com mais de 15 anos. A pergunta é: não faz diferença estender para baixo até aos 12? Ou até 6? Os resultados são na mesma válidos, de confiança? Ou faz, mas já há ensaios para essas idades?
Seja como for é também estranho que essa questão nunca seja abordada pelos especialistas convidados!
(A pergunta é genuína, sem ironias: não sei mesmo)