Pedro Almeida Vieira | Cidadão
O maniqueísmo jornalístico durante a pandemia é uma doença fatal. Desde o início da pandemia, a imprensa – coadjuvada pelos milhões do Governo – tratou de catalogar todas as opiniões contrárias como negacionistas.
Com o tempo, além das pessoas que clara (e erradamente) negavam até a existência do vírus, para o grupo dos negacionistas passaram todos aqueles que contestavam a estratégia assente em muitas idiotas medidas não-farmacológicas; que denunciavam o abandono no diagnóstico e tratamento das outras doenças para priorizar tudo para a covid-19; que contrapunham análises para contextualizar a covid-19 em função das outras pandemias (isto não é a Gripe Espanhola), da área geográfica (a doença não afecta de modo semelhante continentes nem países e nem sequer regiões ou hospitais) e da faixa etária.
Todos estes passaram a negacionistas. A imprensa tinha como única referência a Narrativa Oficial, vista como a Verdade. Não há, neste fenómeno, qualquer diferença com os tempos da Inquisição: Giordano Bruno e Galileu Galilei eram negacionistas. Por acaso com razão.
Ser negacionista não é, convém dizer, sinónimo de alguém com razão que apenas está a ser objecto de perseguição para que a Verdade seja conhecida.
Não tenho essa visão das coisas.
O problema é outro. A catalogação intencionalmente feita pela imprensa – e muito visível agora na vacinação dos adolescentes e jovens adultos, onde houve maior contestação , incluindo por médicos e peritos – tem um iníquo objectivo: chafurdar argumentos com o ferrete de negacionismo. E assim se recusa o debate, se impede a transparência, se abre caminho ao autoritarismo.
O jornalismo, e sobretudo o português, tem demonstrado uma indecente degradação nos últimos meses. Olhar os tiques de Rodrigo Guedes de Carvalho – a semicerrar os olhinhos e a mostrar cumplicidade com o vice-almirante Gouveia e Melo enquanto destrata os supostos negacionistas – é olhar para uma retrete onde jaz, disforme, os imundos restos de um banquete.
As mais recentes notícias da pandemia – que, sem excepção, retratam como negacionistas os contestários ao programa de vacinação (com um fármaco experimental) de jovens de risco nulo de doença grave, porque a prudência deve reger as medidas de Saúde Pública – apenas me merecem um comentário: votos de que, em breve, este jornalismo desapareça por acção de um saneador autoclismo. Os jornalistas, editores e directores que transformaram a imprensa nesta chafurdice são verdadeiros negacionistas do jornalismo. Se se mantiverem activos serão os coveiros de um jornalismo já moribundo.